A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que um imóvel protegido pela impenhorabilidade, por ser considerado bem de família, pode ser penhorado para o pagamento de dívidas contraídas para sua reforma. A decisão baseia-se na exceção prevista no artigo 3º, inciso II, da Lei 8.009/1990, que abre margem para a penhora nesses casos específicos.
O caso julgado envolve uma ação de cobrança movida por uma empresa que prestou serviços de reforma e decoração em um imóvel. Em fase de cumprimento de sentença, o bem foi objeto de penhora, e a proprietária tentou contestar a medida alegando que o imóvel se tratava de bem de família e, portanto, estaria protegido pela impenhorabilidade. Contudo, a Justiça inicialmente rejeitou a impugnação, com base na ausência de provas de que o imóvel tinha tal proteção legal.
Ao analisar o recurso, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve a decisão de primeira instância, entendendo que a dívida estava incluída nas exceções à regra de impenhorabilidade, conforme previsto na Lei 8.009/1990.
O caso chegou ao STJ, onde a proprietária sustentou que o imóvel, onde reside há mais de 18 anos, é bem de família, e que a norma deveria ser interpretada de forma restritiva, em respeito à dignidade humana e ao direito à moradia. No entanto, a relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que, embora a interpretação das exceções deva ser restritiva, não se pode limitar o julgador à literalidade da lei. Para ela, a dívida decorrente de serviços de reforma, que visam a melhoria do próprio imóvel, se enquadra entre as hipóteses que autorizam a penhora.
Nancy Andrighi ressaltou que o objetivo do legislador ao estabelecer essas exceções foi evitar que o devedor utilize a proteção ao bem de família para se esquivar de responsabilidades financeiras assumidas para a aquisição, construção ou reforma do imóvel. Segundo a ministra, seria incoerente permitir que o devedor celebre contratos para reformar sua casa, usufruindo das melhorias, sem honrar a contraprestação devida ao prestador de serviços.
Com a decisão, a Terceira Turma do STJ reforça o entendimento de que a impenhorabilidade do bem de família não é uma proteção absoluta, podendo ser relativizada em casos como este, em que a dívida foi contraída justamente para beneficiar o imóvel protegido.
Esse entendimento já é pacífico entre as turmas do STJ que tratam do direito privado, sendo aplicado inclusive a contratos de empreitada para a construção de imóveis residenciais. A decisão, ao mesmo tempo que preserva a proteção ao direito à moradia, reforça a necessidade de equilíbrio entre o resguardo do bem de família e o cumprimento das obrigações financeiras livremente assumidas pelos proprietários.
A íntegra do acórdão pode ser consultada no Recurso Especial nº 2.082.860.